sábado, setembro 16, 2006

Et tu, Brutus??

Como foste capaz? Como te atreves, sequer? Não existe um pingo de decência nessa tua miserável existência?
Cravaste-me uma estaca pelas costas, directo ao coração. Dum só golpe arruinaste toda a imagem da minha infância. Todas as recordações que tenho passadas na vossa casa estão neste momento congeladas. Os parcos valores familiares que me restavam, e que tanto me esforcei por conservar, jazem neste momento por terra, pisados e sujos. Toda a minha vida me enganaste, afinal. Mas agora que todos os obstáculos desapareceram, finalmente revelas-te. Tantas vezes te defendi e me revoltei quando ouvia as palavras que outros falavam, para mais tarde sentir a desilusão da realidade que elas expunham. A maldade que existe em ti é duma dimensão assustadora. Gostas de ver as pessoas sofrer e adoras tornar as suas vidas num inferno, do teu próprio filho aliás. Inclusivamente, posso dizer que nunca suportei a forma como tratavas o meu Herói. Como podes trair o espírito de alguém que te sustentou a vida inteira? Mais, que te aturou a vida inteira? Mas que raio viu ele em ti, para começar? E agora conspurcas miseravelmente a sua memória, toda uma vida de dedicação familiar e arrasas tudo aquilo que com o seu suor e amor construiu. Que sabes tu sobre o esforço de construir, ou reconstruir, uma vida? Arrotas de barriga confortavelmente cheia sem nunca teres trabalhado um dia da tua vida. Cantas vitória sobre batalhas que nunca combateste. Ingrata. Nunca deste qualquer valor às pessoas que te rodeiam nem à sua dedicação. Remoes na autocomiseração de assistires a uma dedicação e devoção desmedidas que nunca te foram dirigidas. Também nunca fizeste por merecê-las, antes pelo contrário. Toda a vida saltei ao toque de um telefone, fosse para mudar uma lâmpada ou porque tinhas perdido o Super-Homem no meio de Lisboa. Nessas alturas nunca quiseste saber se estava a dormir ou o que quer que estivesse a fazer. Fiz todos os sacrifícios que tive de fazer sem pensar duas vezes, inclusivamente largar um emprego que adorava para poder ter mais disponibilidade para vos assistir. Hipócrita. Não mereces a vida que tens. Que não é tua, sequer. Vives uma vida emprestada.
Encontro-me neste momento a travar a batalha de justificar o meu passado. Tendo crescido e sendo criado em grande parte por ti, que diz isso de mim agora? Como raio posso eu continuar a acreditar nas bases da minha personalidade vendo agora o exemplo da boa merda de valores por que te pautas? Imponho-me a total revisão da minha vida e demolir quaisquer alicerces da minha personalidade que tivesse construído sobre ti. Mas terei que viver para sempre com as recordações gravadas na minha memória, que infelizmente nada posso fazer para censurá-las. Graças a ti vou ter que reconstruir a minha vida inteira. Custa-me particularmente teres posto em causa valores que me eram por demais queridos como a tolerância. Sempre defendi a tolerância na base das relações humanas, e agora questiono-me sobre a validade desta filosofia. Cheguei à triste conclusão que a tolerância é de facto extraordinariamente perigosa. Toda a vida a vi practicada contigo por toda a família e amigos, e veja-se agora o resultado. Já há muito que alguém te devia ter posto no teu lugar. Quantas e quantas vezes ouvi confissões sobre o desespero de te aturar e sobre a intenção recorrente de te mandar pastar. Mas uma firmeza estóica sempre impediu o quebrar dos votos jurados. Vê-se bem a diferença, não é?
Nunca acreditei em entidades divinas, mas sempre fui apologista do conceito de vida para além da morte. Agora é o meu maior desejo que tal seja falso. A idéia de ter que gramar contigo pela eternidade é pura e simplesmente desesperante.
Há muito perdeste o meu respeito. Agora perdeste tudo o resto. Abdicaste do estatuto familiar de outrora. Passaste a ser apenas a viúva do Super-Homem.
Vamos sim fazer as coisas como tu queres.
Mas não mais voltarei a querer olhar para ti.
E fica sabendo que não acredito numa palavra do que dizes.

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