sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Sim ou Não, eis a questão

Esta tem sido uma época prolífica no que respeita a disparates ideológicos. Refiro-me ao fervoroso debate sobre o Referendo do Aborto, como tão familiarmente tem sido designado.
Deveras lamentável tem sido a ausência de elevação na discussão do tema, que julgo teria sido merecedor de melhores considerações políticas, ideológicas, humanitárias, populares e a todos os níveis que possamos identificar.
Tenho ouvido, e lido, as mais fenomenais tolices da autoria de intervenientes diversos, sejam figuras públicas, sejam figuras do público, relativamente aos porquês do Sim e porquês do Não. Chega a parecer um concurso.
Antes de mais convém esclarecer que a despenalização e a liberalização são conceitos que, neste caso, são indissociáveis. Não se pode despenalizar sem liberalizar. Caso contrário iremos cair no ridículo de criar diplomas para não serem cumpridos, como é aliás retratado no sketch de Ricardo Araújo Pereira como Prof. Marcelo Rebelo de Sousa - "Posso fazer um aborto? - Pode! - Mas não é proíbido? - É! - E o que é que me acontece? - Nada!".
Não se pode tão livremente analisar o caso como a permissão para continuar algo que sempre existiu. É um facto que a prática abortiva é milenar, mas não é por isso que deve ser nem despenalizada, nem liberalizada. Existe muito mais a considerar, o que não implica que a discussão tenha que assumir um grau de complexidade desmedido.
A sociedade tem que saber acompanhar o avanço do tempo e tem que saber adaptar-se à evolução dos seus elementos. Não vivemos na idade média. Nem tão pouco no tempo de Salazar.
A Família também tem que saber evoluir. E o facto é que essa evolução acontece ao ritmo da dança económica, política, social, etc.. Hoje, o conceito da própria família é dirigido por diversos factores externos a si mesma. O primeiro é, inevitavelmente, económico. Quando chega a altura da vida de qualquer casal ponderar a sua descendência a primeira pergunta que surge é "e temos dinheiro para isso?". Ter filhos implica um investimento avultado e a nossa economia não oferece segurança para que os casais se permitam lançar nessa aventura sem pesarem bem a sua condição. Já vi faltar mais para que seja necessário pedir empréstimos para se ter filhos... Muita família disfuncional tem surgido como consequência da falta de capacidade desta em fazer face às suas obrigações e ainda ter capacidade de se permitir ao luxo de uma vida feliz.
Dois factores urge considerar, primeiro relativamente à despenalização do aborto, uma questão de essência simples: Deve uma mulher ser encarcerada por se sujeitar a um aborto à 10ª semana e 1 dia? Podemos continuar a aplicar uma lei que, essa sim, é perfeitamente desfasada de proporção? Porque é justamente isso que neste momento está em causa.
Segundo, deve a prática abortiva ser liberalizada e assistida pelos sistemas de saúde público e privado? Poderá uma consulta médica fazer a diferença na sobrevivência de um núcleo familiar? Pior azar que ser uma criança indesejada não será ser uma criança inconveniente? Porque essa acabará fatalmente por carregar o peso do desaire da família.
Talvez seja uma forma um pouco crua de ver a questão. Mas não será exactamente assim que será vista por quem se encontrar nessa situação?
Sejamos realistas, ninguém aborta por dá-cá-aquela-palha. A prática abortiva nunca será uma alternativa à contracepção. Que mulher estará na disposição de se sujeitar a tal intervenção e ao respectivo processo de recuperação? Além de doloroso, não se sai dali pronta para outra.
Temos assim em tão pouca conta as nossas mulheres e as nossas filhas (salvo seja) que não consideremos que estas serão capazes de julgarem por si próprias uma situação de gravidez inconveniente? Que maridos somos nós então? Que educadores?

Dia 11 votemos em consciência. Principalmente pela consciência de quem precisa do nosso voto.

Beijos & Abraços
D. Xuggo, Provedor da Consciência Alheia

1 comentário:

Eunice disse...

Simples, conciso, claro. É por estas e por outras que gosto de ti (pá) e que apesar de não concordar com a forma da pergunta, irei votar sim.